Luta
no Mar
A
ação dos Corsários
Corsários
alemães
A partir de junho de 1941 os
cruzadores auxiliares foram as únicas naves de superfície que se
mantiveram em operações, no lado alemão. Mesmo assim, sua ação
foi permanentemente prejudicada pelas novas armas empregadas pelos
Aliados. Contudo, passaria muito tempo antes que as grandes rotas
oceânicas fossem patrulhadas pelo ar a pela superfície dos mares,
com a necessária eficácia para afastar a ameaça dos corsários.
Com efeito, esta forma de guerra chegou ao fim somente em 1943.
Quando o Scheer, em outubro de 1940, iniciou a sua missão no
Atlântico, o Widder, que deslocava 7.900 toneladas e desenvolvia 14
nós de velocidade, entrava no porto de regresso de uma incursão
pelo Atlântico, no curso da qual havia afundado onze barcos e
capturado um petroleiro, com um deslocamento total de 66.000
toneladas.
A segunda nave corsária que
regressou ao porto, na primavera de 1941, foi o cruzador auxiliar
Thor, uma ex-baleeira de 3.900 toneladas e 16 nós de velocidade. Sua
primeira presa foi um grande petroleiro, que, depois de capturado,
foi enviado à França. Depois, internando-se no Atlântico
setentrional, o Thor uniu-se ao Scheer e o acompanhou, por algum
tempo, em sua campanha, atacando alguns barcos aliados. O primeiro
deles foi o Alcântara, de 22.000 toneladas, seriamente danificado.
Em dezembro de 1940, foi atingido o Carnavon Castle, de 20.000
toneladas. Em abril de 1941, depois de áspero combate, foi afundado
o Voltaire, de 13.000 toneladas. Ao todo, como resultado final da sua
primeira saída, 12 naves aliadas, com um total de 96.000 toneladas,
foram postas a pique.
Em agosto de 1941, regressou
ao porto o Orion, após uma missão que se prolongara por 17 meses.
Na sua longa travessia, o Orion navegara pelos mares do sul e pelo
oceano Índico. Entre os episódios que esse navio protagonizou,
destaca-se, pela audácia demonstrada pela tripulação, o lançamento
de minas no Golfo de Hauraki, diante de Auckland, em Nova Zelândia,
sem ser visto.
Mais tarde, o Orion se reuniu
ao Komet, proveniente do Estreito de Bering. O Komet com 3.300
toneladas e 15 nós de velocidade, era o menor dos corsários
alemães; em compensação, os seis canhões de 150 milímetros e os
dez tubos lança-torpedos de que era munido o convertiam em um dos
mais fortemente armados.
Os dois navios operaram
juntos, durante um certo tempo, nos mares do sul, afundando três
navios especialmente preparados para o transporte de fosfatos. O
Komet, por sua vez, canhoneou as instalações de armazenamento
daqueles fosfatos na ilha de Nauru, interrompendo durante vários
meses a provisão desse importante fertilizante.
O Orion, ao todo, afundou dez
barcos inimigos, com um total de 82.000 toneladas. O Komet, por sua
vez, destruiu sete, totalizando 42.000 toneladas.
O Komet atuou com êxito
durante um certo tempo na rota Nova Zelândia-Canal do Panamá.
Depois, ingressou novamente no Atlântico, cruzando o Cabo Horn. Em
novembro de 1941 efetuou seu regresso ao porto, através do Canal da
Mancha.
Os dois cruzadores auxiliares,
Atlantis, de 7.900 toneladas e 16 nós, e Pingüim, de 7.800
toneladas e 16 nós, foram afundados pelos Aliados depois de um longo
cruzeiro.
O Atlantis operou,
principalmente, no oceano Índico, onde torpedeou dois terços das 22
naves que aprisionou, com um total de 146.000 toneladas.
A 22 de novembro de 1941, o
Atlantis foi surpreendido por um cruzador inglês no Atlântico
meridional, quando estava reabastecendo um submarino alemão. Depois
de um curto combate, o corsário alemão foi posto a pique pelos
disparos da nave aliada. Esta, em seguida, diante do perigo que
representava a presença do submersível, afastou-se do local, sem
recolher das águas os náufragos, que foram salvos, pouco depois,
pelo Python, barco auxiliar de submarinos. Este último, no entanto,
foi vítima de um cruzador aliado, indo ao fundo poucos dias mais
tarde. Os náufragos, o bordo de barcos salva-vidas, foram rebocados
por dois submarinos alemães que se encontravam nas proximidades.
Finalmente, ao encontrarem-se com outros dois submersíveis, os
tripulantes salvos das águas foram transferidos para eles. Os
submarinos, sobrecarregados, rumaram para o norte. Na altura das
Açores, por fim, se encontraram com quatro submarinos italianos,
para os quais transportaram a metade dos náufragos, que regressaram
então à sua pátria sem sofrer mais nenhum inconveniente.
Foi durante o seu cruzeiro
pelo oceano Índico que o comandante do Atlantis equipou o Speybank,
de 5.000 toneladas, como cruzador auxiliar, batizando-o de
Doggerbank. No decorrer da sua missão esta nave lançou minas nas
cercanias do Cabo das Agulhas, pondo a pique, com elas, três barcos
aliados, que totalizavam 20.000 toneladas. Entre os cruzadores
auxiliares, o Pingüim obteve os maiores sucessos, operando
principalmente no oceano Índico e na zona antártica, próxima ao
indico. Entre suas mais audaciosas incursões, conta-se o lançamento
de minas nas proximidades de Sydney, Austrália.
O maior sucesso do Pingüim,
porém, foi obtido graças à hábil interceptação das comunicações
do telégrafo sem fio do inimigo. Enviando mensagens falsas, o
Pingüim conseguiu atrair a uma armadilha três grandes naves
norueguesas, dedicadas à pesca da baleia, capturando-as. Do mesmo
modo, o navio corsário conseguiu apoderar-se de onze pequenas
baleeiras. As três naves maiores foram imediatamente enviadas rumo à
França, onde desembarcaram 22.000 toneladas de óleo de baleia. Dez
das baleeiras também seguiram o mesmo rumo, tripuladas em sua
maioria por marinheiros do Scheer, que acorrera em auxílio do
Pingüim. Ao chegar ao porto, as baleeiras foram integradas numa
flotilha de barcos caça-submarinos. A décima primeira baleeira foi
posta a serviço na qualidade de nave de apoio do Pingüim. O
petroleiro Storstadt, também, foi rebatizado com o nome de Passat e,
depois de utilizado durante algum tempo como nave de apoio do
Pingüim, foi transformado em lançador de minas. Cumprindo essa
missão, espalhou minas diante de Melbourne e Adelaide; pelo menos,
três barcos, com um total de 17.000 toneladas, foram perdidos em
conseqüência dessa ação.
Fecham-se as garras
No dia 7 de maio, o Pingüim
atacou e afundou um petroleiro na zona ocidental norte do oceano
Índico. Na manhã seguinte, avistado por um avião de
reconhecimento, sua posição foi comunicada a um cruzador pesado, o
Cornwall. Este, após rápido deslocamento, cortou a retirada ao
corsário alemão, obrigando-o a aceitar o combate. A luta desigual
não tardou a se definir. Apesar de atingido por alguns projéteis do
navio alemão, o cruzador inglês mostrou rapidamente a potência
tremenda dos seus canhões de 203 milímetros. Um desses disparos
atingiu em cheio um dos porões onde estavam armazenadas 130 minas. A
gigantesca explosão destruiu totalmente o barco, sobrando apenas
pouquíssimos sobreviventes. O Passat, por sua vez, conseguiu
escapar, chegando incólume à Europa.
O resultado final da missão
do Pingüim, que durou quase onze meses, foi a captura de 28 unidades
inimigas, com um total de 136.000 toneladas; outros cinco barcos,
totalizando 30.000 toneladas, foram afundados por meio de minas.
Nos primeiros dias de dezembro
de 1941, o Thor partiu para uma segunda missão, e operando no
Atlântico meridional e no oceano Índico, pôs dez navios a pique,
com um total de 56.000 toneladas. Em fins de setembro de 1942, entrou
em Yokohama, e ali, dois meses mais tarde, foi destruído por um
incêndio provocado pela explosão ocorrida no barco auxiliar
Uckermark, que estava ao seu lado.
O Michel, um barco polonês de
4.740 toneladas, armado como cruzador auxiliar pelos alemães, partiu
de um porto francês, em março de 1942 e operou, com grande êxito,
no Atlântico central e meridional e no oceano Índico. Em março de
1943, chegou ao Japão, depois de destruir 16 barcos aliados com um
total de 106.000 toneladas. Uma interessante característica do
Michel era a de contar a bordo com uma lancha rápida que era
utilizada para efetuar ataques noturnos a navios que fossem avistados
durante o dia.
O Stier era um cruzador
auxiliar de 4.800 toneladas e 14 nós de velocidade, que partiu na
primavera de 1942, cruzando, numa manobra arriscada, o Canal da
Mancha. No mês de maio encontrava-se em mar aberto, pronto a iniciar
suas aventuras.
Depois de afundar três barcos
no Atlântico central, em fins de setembro deparou no seu rumo com o
Stephen Hopkins, navio-mercante que lhe ofereceu séria resistência.
O barco aliado, afinal, foi afundado, porém o Stier, atingido
também, envolto em chamas, afundou rapidamente. Em sua curta
campanha, o corsário alemão afundara quatro barcos, com um total de
29.000 toneladas.
Os corsários cedem
A partir desse momento, a
Alemanha já não enviou mais corsários ao Atlântico. As defesas
aliadas, coordenando a ação de aviões de observação, barcos de
escolta e patrulha, e radares, tornaram impossíveis as aventuras de
novos cruzadores auxiliares.
Em outubro de 1942, nas
cercanias de Cherburgo, foi afundado o Komet, quando tentava forçar
o bloqueio e alcançar o Atlântico para uma segunda missão.
O Togo, em fevereiro de 1943,
procurando chegar ao mar aberto, conseguiu atingir Boulogne, porto em
que se teve que abrigar ao ser atacado e avariado por uma bomba
lançada pela aviação inimiga. O Michel, que já foi citado, operou
entre os meses de maio e setembro de 1943 no oceano Índico
oriental-sul, afundando quatro navios aliados, com um total de 32.000
toneladas. Ao regressar à base, porém, a 600 milhas da costa do
Japão, foi atacado e afundado por um submarino americano.
Diante da "cortina"
levantada pela defesa aliada, também as naves italianas tiveram que
interromper as suas atividades e desistir dos seus intentos de forçar
o bloqueio. Os barcos do Eixo navegavam, principalmente, entre os
portos europeus e o Japão, transportando mercadorias essenciais para
o esforço de guerra. O último barco italiano que zarpou rumo ao
Extremo Oriente foi o Cortellazzo que partiu a 11 de novembro de
1942, enquanto o último que efetuou viagem de regresso foi o
Orseolo, no fim de março de 1943.
No dia 8 de abril de 1943
produziu-se uma última tentativa sem êxito, porém. Foi a do
Himalaia que, atacado por aviões aliados, teve que se refugiar no
porto de Bordeaux.
Os "forçadores do
bloqueio"
As últimas operações dos
"forçadores do bloqueio" marcaram o final de um episódio
que não voltaria a se repetir, ao serem intensificados o emprego dos
aviões e do radar. Contudo, um minucioso balanço das atividades
cumpridas até então, permitem revelar que o mais completo êxito
acompanhara os corsários até aquele momento. De fato, os cruzadores
auxiliares haviam enviado ao fundo do mar perto de 900.000 toneladas
de barcos inimigos; esta cifra era semelhante à produção do ano
inteiro dos estaleiros britânicos. Ao mesmo tempo, haviam obrigado
dezenas de barcos de guerra a patrulhar dia e noite milhares de
milhas quadradas de oceanos, para precaver-se da possível aparição
do inimigo.
Durante as primeiras
operações, o sucesso acompanhou a campanha, pelo fato de os
comandantes alemães estarem de posse, segundo afirmou o Almirante
alemão Friedrich Ruge, chefe do Estado-Maior da Kriegsmarine, dos
códigos empregados pelos barcos aliados. Posteriormente, porém, um
erro cometido pelo comandante de um corsário provocou uma mudança
radical da situação. Esse comandante, quando procedia ao
interrogatório de oficiais de um navio inglês que acabava de mandar
para o fundo do mar, cometeu a imprudência de citar o fato. Esses
prisioneiros foram mais tarde desembarcados numa ilha, onde foram
recolhidos por outro navio aliado. A informação, então em poder
dos marujos ingleses, chegou rapidamente ao comando naval de Londres,
onde foram tomadas as providências imediatas para a mudança de
todos os códigos utilizados.
Os comandantes dos corsários
deviam atuar sempre com a máxima astúcia em seus cruzeiros pelos
mares. Eis um exemplo que mostra claramente com que sutileza se
comportavam corsários e "caçadores". O Pingüim, cruzador
auxiliar, disfarçado de navio-mercante norueguês, foi divisado e
sobrevoado por aviões aliados; estes, convencidos de que se tratava
de um barco neutro, giraram para afastar-se quando um dos pilotos
reparou num detalhe que pôs a perder os alemães: por que nenhum
tripulante os havia saudado do convés, como faziam habitualmente?
Os "forçadores do
bloqueio" prestaram ótimos serviços no começo das
hostilidades. Porém, tendo sua eficiência diminuída cada vez mais,
logo decaíram de importância prática. Nos dois primeiros invernos
da guerra chegaram, provenientes de portos neutros, muitos barcos
mercantes. Outros partiram, por sua vez, rumo ao Extremo Oriente. O
programa de navegação previsto considerava a partida de doze barcos
mercantes em cada inverno, rumo às costas longínquas do Japão, a
fim de carregar materiais estratégicos indispensáveis para a
manutenção da guerra. Entre esses materiais, ocupava o primeiro
lugar a borracha natural, indispensável componente da sintética.
Eram, também, necessários, molibdênio e tungstênio para a
produção de aços especiais e produtos químicos e medicinais,
assim como cobre e zinco, mica, chá e café. Por outro lado, os
alemães enviavam ao Japão maquinarias e, numa ocasião, dois
submersíveis do tipo IX-C.
De acordo com o plano inicial,
o total das importações devia alcançar 50.000 toneladas anuais.
Essas previsões, porém, eram extremamente otimistas e se afastavam
muito da realidade.
No inverno de 1941 a 1942,
nove das doze tentativas realizadas pelos navios do Eixo tiveram
êxito. No inverno seguinte, somente quatro dos quinze barcos
partidos do Japão chegaram às costas da França. Em 1943-44, uma só
nave, de cinco, conseguiu passar pelo bloqueio.
Ao todo, de 31 barcos
cargueiros que zarparam de portos do sudeste da Ásia, em viagem
direta para a Alemanha, somente 17 chegaram à sua meta.
Nos últimos dois anos de
guerra, o transporte de matérias-primas absolutamente indispensáveis
foi efetuado, em escala reduzidíssima, por meio de submarinos. E
também neste caso as perdas foram muito elevadas: de 13, somente 5
chegaram ao seu destino. O total de carga embarcada foi de 217.000
toneladas, das quais 114.000 (entre estas 45.000 de borracha)
chegaram ao destino.
A odisséia do Kormoran
No dia 20 de novembro de 1941,
o cruzador australiano Sydney era esperado em Freemantle, sudoeste da
Austrália. Mas o Sydney nunca mais chegou ao porto. Até o dia 24,
as estações de rádio enviaram chamados contínuos, numa busca
incessante. No dia 24 foi que se teve a primeira notícia. Nesse dia,
as bases aliadas captaram uma mensagem do petroleiro Trocas. O
comunicado dizia que resgatara das águas vinte e cinco marinheiros
alemães, que se encontravam em um bote, à deriva. Os alemães
declaravam pertencer a uma unidade de guerra que havia posto a pique
um cruzador inglês. Outros náufragos alemães foram salvos nos dias
seguintes: o navio de carga Koolinda recuperou uma lancha com trinta
marinheiros; o Aquitania, uma balsa com vinte e seis e o canhoneira
Yarra, por fim, uma outra lancha, com setenta e dois. Outros marujos
alcançaram por seus próprios meios o costa da Austrália. Ao todo,
trezentos e quinze homens do navio alemão foram salvos. Todos, em
geral, se limitaram a obedecer as ordens recebidas de não fornecer
aos ingleses dados que lhes pudessem ser de utilidade em sua campanha
e, simplesmente, declararam que sua nave era um mercante armado que
havia naufragado em combate com um cruzador britânico. E, apesar da
informação parecer realmente fantástica (era, de fato, difícil
admitir que um mercante armado fosse capaz de destruir um cruzador),
os ingleses tiveram que aceitar, muito a contragosto, o fato como
real.
O Sydney não era um cruzador
lançado recentemente no conflito. Tampouco sua tripulação estava
em missão de treinamento, nem era formada por novatos. A belonave,
que entrara em serviço em 1935, deslocava 6.830 toneladas e dispunha
de um armamento de oito canhões de 152 mm, oito antiaéreos de 102,
oito tubos lança-torpedos e numerosas metralhadoras. A blindagem era
considerável e sua velocidade alcançava 32 nós. Da sua capacidade
de combate já havia dado boa prova em 1940 quando, junto com cinco
caça-torpedeiros, enfrentara dois cruzadores leves italianos,
avariando um deles, o Colleoni. Os náufragos haviam dito,
indiscutivelmente, a verdade. O Sydney fôra destruído e somente
meses mais tarde, na praia da Ilha Chritsmas, a 1.760 km do local da
batalha, foi encontrado o cadáver de um marinheiro inglês que
trazia bordadas em seu uniforme as palavras "H. M. A. S.
Sydney".
Duas semanas depois do
desaparecimento do Sydney, o Comando Supremo alemão deu publicidade
a um comunicado cujo texto dizia: "Nas proximidades da costa da
Austrália, travou-se uma batalha naval entre o cruzador auxiliar
alemão Kormoran e o cruzador australiano Sydney. Sob o comando do
capitão de fragata Detmers, o cruzador auxiliar alemão superou o
inimigo, muito superior em armamento e velocidade, e o pôs a pique.
O Sydney, de 6.830 toneladas, afundou com toda a tripulação de 42
oficiais e 603 marinheiros. Em vista das grandes avarias sofridas no
combate, o barco alemão teve que ser abandonado, depois do triunfo.
Grande parte da tripulação foi salva e chegou à costa da
Austrália".
O Kormoran fôra construído
em Kiel, em 1938, e destinado ao tráfego com a América, sob o nome
de Steiermark. Deslocava 9.400 toneladas e media 157 metros de proa a
popa. Os motores diesel de que era provido, lhe proporcionavam uma
potência de 16.000 HP e uma velocidade de 18 nós. Tecnicamente, era
um barco moderníssimo.
Antes da eclosão da guerra, a
marinha alemã decidira transformar seis velozes barcos mercantes em
naves de guerra. Essas seis unidades constituiriam a primeira série
de navios corsários destinados a interceptar a navegação aliada.
Uma segunda série foi feita, mais tarde, com a maior presteza. Desta
última fazia parte o Steiermark, rebatizado Kormoran. E este não
era o seu único nome. Segundo a denominação em código do comando
alemão, o barco era conhecido como Schiff 41 e, também, HSK 8. Os
ingleses, para distingui-lo dos demais corsários, o chamavam Raider
G".
A transformação
anteriormente citada não consistia somente em instalar a bordo
alguns canhões e tubos lança-torpedos; era necessário ainda
adaptar o navio às novas condições das atividades que
desempenharia. De fato, o barco teria que passar muitos meses longe
de suas bases, sem possibilidades de receber abastecimentos nem
combustível. Por outro lado, deveria estar em condições de
dissimular o seu aspeto e poder ser transformado, rapidamente,
"noutra" nave. Para tal fim, transportariam chaminés,
mastros e estruturas de armação fácil, capazes de fazer variar o
aspeto exterior.
No Kormoran foram montados
seis canhões de 150 mm, quatro metralhadoras antiaéreas de 37 e
outras tantas de 20, além de quatro lança-torpedos de 533 mm.
Embarcaram-se, também, dois hidraviões de reconhecimento, uma
lancha-torpedeira e 420 minas. A autonomia da nave era de 120.000
quilômetros, o que lhe permitia dar três vezes a volto ao mundo a
uma velocidade de 10 nós.
A tripulação, cuidadosamente
selecionada, ignoraria, até chegar ao alto mar, a verdadeira
identidade e missão do navio. Somente o capitão tinha conhecimento
das ordens.
Numa nevoenta noite de início
de dezembro de 1940, o Kormoran abandonou Gotenhaven (a antiga cidade
polonesa de Gdynia) e enfrentou mar aberto. O navio partiu
apresentando o aspecto do cargueiro soviético Molotov.
O falso Molotov navegou rumo
ao norte e a 13 de dezembro atravessou o estreito que separa a
Islândia da Groelândia, seguindo a rota cumprida, cinco semanas
antes, pelo encouraçado Admiral Scheer. Depois, rumou para o sul e
se dirigiu para o oceano Atlântico.
A 6 de janeiro de 1941 o
Kormoran fez sua primeiro vítima: o navio-transporte grego Antonis,
nas proximidades das Ilhas de Cabo Verde. Foi a prova de fogo para o
HSK 8 e tudo se desenrolou perfeitamente. O corsário se aproximou
lentamente do navio aliado e depois, descobrindo os canhões, içou a
bandeira de guerra da Kriegsmarine. Imediatamente, foi dada a ordem
de abandonar o navio e não utilizar a instalação de comunicações.
Minutos mais tarde, com a tripulação do barco grego em seus botes
salva-vidas, alguns canhonaços foram suficientes para afundar o
navio.
Doze dias mais tarde, o
Kormoran encontrou em seu caminho o petroleiro britânico British
Union, afundando-o nas águas do Atlântico central. O barco aliado
ainda conseguiu emitir pedidos de socorro, porém, o Kormoran,
escapou habilmente à perseguição. O cruzador auxiliar britânico
Arawa, que, na escuridão da noite, chegou a divisar os clarões dos
canhões do Kormoran, quando afundava sua segunda presa, lançou-se
em seu encalço, sem resultado positivo.
Em seguida, já nas
proximidades da costa do Brasil, o Kormoran realizou uma dupla caçada
afortunada: o petroleiro Afric Star e o navio-transporte Eurylochus,
que conduzia aviões para a frente de combate da África. Também
estes dois barcos conseguiram emitir pedidos de socorro, antes de
serem afundados pelos disparos do corsário alemão. Os tripulantes
de ambos os barcos, aliás, foram transportados, na qualidade de
prisioneiros, ao barco alemão Speewald. Neste, os cativos foram
conduzidos à França e ali desembarcados.
O comando inglês, a esta
altura dos acontecimentos, decidiu enfrentar a situação com uma
tentativa de dar caça ao corsário inimigo. Enviou um cruzador
pesado para patrulhar a rota das naves aliadas na altura de Serra
Leoa, na África, e outro cruzador pesado para percorrer a zona na
qual foram afundados os dois últimos barcos.
Enquanto isso, o Comandante
Detmers conseguiu afastar-se da zona perigoso e, longe dali,
encontrou-se com outros barcos alemães, o barco-cisterna Nordmark,
que o abasteceu de combustível, o transporte Duquesa e o corsário
Pingüim. É difícil compreender como, com toda a severa vigilância
exercida pelos barcos de patrulha e pelos aviões aliados, os navios
alemães puderam reunir-se, assim, quase sem nenhum risco. Porém,
temos que concluir que a vastidão do oceano e a habilidade
indiscutível dos capitães alemães, tornaram passíveis tais
encontros.
Em meados de março, o Schiff
41 reabasteceu de combustível o submarino U-124 e, mais tarde,
encontrou-se com o encouraçado Scheer; em seguida, reabasteceu de
combustível aos submersíveis U-105 e U-106 e, por fim, a 22 de
março, afundou o petroleiro aliado "A nita".
Três dias mais tarde, 25 de
março, o Kormoran capturou o petroleiro britânico Canadolite, de
11.300 toneladas e transferiu para bordo do mesmo uma tripulação
que deveria conduzi-lo a Bordeaux, na França.
Poucos dias depois ocorreu um
novo encontro com petroleiros alemães e com o corsário Atlantis. Em
seguida, duas novas vítimas aumentam a lista dos sucessos do
Kormoran: uma delas é o transporte inglês Craftsman, carregado com
redes de aço destinadas a proteger o porto da Cidade do Cabo.
A esta altura dos
acontecimentos, o Comandante Detmers, do corsário alemão, julgou
prudente uma mudança de local para continuar as operações. De
fato, o setor do Atlântico, muito patrulhado, se convertera numa
zona extremamente perigosa, que podia em pouco tempo transformar-se
em armadilha mortal. Por isso, Detmers decidiu aproar para o oceano
Índico, disfarçando o barco que, a partir daquele momento, assumiu
o aspecto de um cargueiro japonês, o Sakito Maru. Os marinheiros,
trabalhando arduamente, pintaram todo o barco de preto, e
inscreveram, com letras garrafais, o novo nome do navio. Também
grandes bandeiras japonesas foram pintadas nos costados do barco. Nas
quatro semanas seguintes, nenhum navio inimigo foi avistado e apenas
ocorreu um encontro com outra nave alemã, o transporte Alstertor.
Detmers resolveu trocar
novamente o aspecto do Kormoran que, desta vez, se transformou no
mercante Kinko Maru, também japonês. Um momento em que a situação
assumiu um aspecto grave para o corsário foi quando surgiu um
cruzador auxiliar britânico, que, navegava com as luzes apagadas. O
encontro, contudo, não se produziu e os barcos se afastaram sem
combater.
Um perigo maior se apresentou
a 24 de junho, poucas horas antes da projetada colocação de minas
na entrado do porto de Madras. Também nesta oportunidade foi um
cruzador auxiliar, o Canton. Este, porém, obedecendo as instruções
que lhe ordenavam evitar incidentes com barcos do Sol Nascente,
evitou o encontro com o que acreditou ser um navio japonês. Porém
enviou, imediatamente, uma mensagem cifrada perguntando se o Kinka
Maru era esperado em Madras. Afinal, enquanto no Kormoran a
tripulação se preparava para a batalha iminente, o Canton,
inexplicavelmente, se afastou.
Dois dias mais tarde, o barco
alemão encontra na sua rota duas novas presas: o mercante iugoslavo
Velebit e o inglês Mareebo. Os dois navios foram canhoneados e
afundados rapidamente
.
A esta altura dos
acontecimentos, o Kormoran atingiu já sete meses de campanha
ininterrupta. Os motores do barco que até aquele momento
corresponderam perfeitamente necessitam de indispensáveis reparos. E
Detmers, desejando manter sua nave em perfeitas condições de
navegação, decidiu escolher uma afastada região do Índico para
proceder a uma minuciosa revisão geral. Antes de paralisar suas
andanças, o comandante alemão ordenou uma nova transformação do
navio, que assumiu a aparência do Straat Malakka, mercante holandês.
Em seguida; o barco alemão
foi submetido a uma rigorosa revisão dos seus motores para, logo
depois, reiniciar suas tropelias.
A primeira presa do novo
período e, ao mesmo tempo, a última de sua existência de corsário,
foi um mercante grego, detido e afundado no dia 10 de setembro.
Depois, em busca de novas vítimas, iniciou um prolongado cruzeiro
através do Índico, sem resultados positivos. Detmers, uma vez mais,
decidiu mudar a zona de suas atividades, e aproou rumo à Austrália.
O começo do fim
Por volta das quatro da tarde
de 19 de novembro de 1941, o HSK 8 navegava a 10 nós de velocidade,
a 300 km a oeste da Austrália, rumo ao norte. Os vigias, atentos,
exploram o horizonte com potentes binóculos. De súbito, um dos
homens grita: "Nave à proa, um pouco a estibordo!" Apesar
do rumo de ambos os navios, quase paralelo e em sentido oposto, os
alemães percebem que têm diante deles a inconfundível silhueta de
um cruzador inimigo. E necessário apelar para a astúcia e assim age
Detmers. O comandante alemão ordena ao seu timoneiro que altere a
rota e comece a afastar-se do navio inimigo, aumentando gradualmente
a velocidade do barco. Porém, são percebidos pelo barco aliado,
que, por sua vez, altera a sua rota e se dirige para o Kormoran,
acelerando a marcha. A velocidade do corsário passa de 10 a 15 nós
e a do cruzador de 20 para 25. A caçada se inicia.
Detmers, marujo experiente e
combatente astuto, pensa rapidamente: "O que faria um barco
realmente holandês nessa situação?" e sem hesitação, ordena
ao seu radiotelegrafista que lance pedidos de socorro. Estes cortam
os ares imediatamente: "... RRRR Straat Malakka... Estamos sendo
atacados por uma nave corsária inimiga. Nossa posição: 26° 33'
sul, 111° 00' leste". Os vigias, enquanto isso, estudam
nervosamente a atitude do cruzador inimigo. O Sydney, sem diminuir a
velocidade, já está bem perto. Da ponte da belonave aliada, um
sinaleiro começa a agitar suas bandeiras: "Exibam o prefixo".
Detmers, procurando ganhar tempo, manda ascender a um dos mastros os
letras que caracterizam o barco holandês internacionalmente: "PKQI".
No Sydney, contudo, não é
aceita aquela informação precária. E reiteram: "Exibam o
prefixo em código". Trata-se de um código que todos os navios
aliados conhecem e o Kormoran logicamente, desconhece.
Nesse momento, a distância
que separa os dois barcos é de 1.200 metros. Detmers compreende que
chegou o momento de arriscar tudo contra o Sydney. E sabe que os
instantes são preciosos, diante das negras bocas dos canhões do
cruzador australiano.
Uma ordem partiu dos lábios
de Detmers: "Abaixo as falsas estruturas! Abram fogo! Lancem os
torpedos!"
Um segundo mais tarde, o
estrépito das falsas paredes caindo une-se com o estrondo dos três
canhões de 150 mm rompendo fogo. As metralhadoras de 37 mm, também,
varrem com seu fogo, a nave inimiga. E no mastro mais elevado, a
bandeira de guerra da Kriegsmarine, se eleva rapidamente.
Dois torpedos são lançados e
começam sua vertiginosa corrida para o Sydney. O cruzador
australiano, surpreendido por esse furacão de fogo que não tardou
mais que dez segundos para desencadear-se, recebeu a descarga em
cheio. A resposta, porém, não se fez esperar. Os canhões do Sydney
vomitam fogo, atingido, à queima-roupa, o Kormoran no setor do
depósito de combustível. Ao mesmo tempo, um torpedo do barco alemão
explode no cruzador inglês, colocando fora de combate uma de suas
torres de 152 mm. A batalha atinge assim uma extrema violência. A
curta porém intensíssima refrega começa a se definir quando o
Kormoran se vê, de súbito, envolvido numa densa nuvem de fumaça
negra e as chamas rubras começam a lamber o convés. Os marujos
alemães, abandonando seus postos, dirigem-se para os botes
salva-vidas, num salve-se quem puder. O corsário alemão abandona a
luta, derrotado. Porém, não sem antes arrastar consigo o inimigo. O
Sydney, de fato, permanece um instante à deriva, para depois
explodir com incrível violência; começa então a naufragar...
O desigual combate se conclui
com o afundamento das duas naves. E o Kormoran ficou sendo
protagonista de um episódio incrível: o de um mercante armado que
luta e afunda um cruzador inimigo.
Anexo
Bases
As bases de submarinos mais
importantes na Alemanha e nos países ocupados, eram:
1) Hamburgo, na Alemanha.
2) Brest, na França.
3) Lorient, na França.
4) Saint Nazaire, na França.
5) Bordeaux, na França.
6) Le Havre, na França (foi,
eventualmente. utilizado como base de submarinos)
7) La Pallice, na França.
8) Trondheim, na Noruega.
Fogo!...
Era outono de 1944 e o
submarino alemão flutuava num mar sereno sob um céu límpido. A
visibilidade era boa.
- Barco a vista! - gritou o
vigia. - Submergir! - ordenou o capitão.
O "U" fechou suas
escotilhas e mergulhou. Os ruídos começaram a se tornar opacos,
adquirindo um som peculiar. O comandante tirou o barrete e pregou o
olho no periscópio. Pouco a pouco, o diminuto ponto descoberto pelo
vigia foi-se definindo. Eram três destróieres que avançavam, agora
abrindo em leque a formação. Provavelmente, haviam avistado o
submarino.
O comandante defrontava-se com
duas alternativas: travar batalha ou fugir simplesmente. Não foi
necessário pensar muito. Com os destróieres nos calcanhares, poucas
eram as possibilidades. Decidiu atacar.
- Leme a bombordo! Força
máxima! ... Toda velocidade nesse rumo! Escolheu o destróier do
centro. Os navios ainda não estavam suficientemente separados e uma
boa explosão no meio da formação poderia atingir a todos.
- Prontidão, torpedo um! ...
- em seguida - Proa, disparar! Fogo!
O submarino pareceu apenas
balançar suavemente. O navio do centro voou em pedaços. E o "U"
sofreu, então, uma violenta sacudidela.
O capitão voltou ao
periscópio. Um dos destróieres dirigia-se em linha reta contra ele.
O outro, enquanto isso, navegava obliquamente.
- Toda velocidade!... Torpedo
dois!... - O comandante segurou a ordem de fogo; esperou que o barco
se aproximasse mais ainda. A tensão era tremenda. Se nesse momento
explodissem cargas de profundidade estariam perdidos. Porém,
aparentemente, também o capitão do destróier queria aproximar-se
mais.
-Fogo! - bradou o alemão.
O impacto atingiu a popa da
nave aliada. No submarino não havia tempo para averiguar se o
impacto era mortal.
Rapidamente, buscaram as
profundezas para proteger-se.
O destróier desprendia fumaça
e sua marcha era cada vez mais lenta. O "U" continuou algum
tempo ainda mergulhado até que, afinal, o capitão deu ordem para
subir. Quando emergiram, encontraram o mar sereno sob um céu
límpido. Era outono de 1944 e a visibilidade estava muito boa.
Déficit de submarinos
alemães
Meses
Programados
Produzidos
1944
Fevereiro
1
Março
3
Abril
6
1
Maio
11
1
Junho
16
3
Julho
19
6
Agosto
28
11
Setembro
37
19
Outubro
42
22
Novembro
42
29
Dezembro
40
36
1945
Janeiro
42
24
Fevereiro
44
16
Março
46
12
Abril
46
No presente quadro podemos
apreciar a normalização da fabricação de submarinos (tipos 21 e
23) até dezembro de 1944, e, logo após, sua rápida queda nos
quatro meses seguintes.
Onde nasciam os submarinos
A Alemanha reativara a
produção de submarinos a partir de 1935. Os progressos técnicos
acumulados durante a Primeira Guerra Mundial desenvolveram-.se com
algumas interferências, devido ao Tratado de Versailles.
Ao começar a Segunda Guerra
Mundial, os alemães possuíam sete grandes estaleiros para a
fabricação de submarinos. Os principais eram:
1) Estaleiro Howsldswerke und
Blohm-Voss, de Hamburgo.
2) Estaleiro Wesser und
Deschimag, de Bremen.
3) Estaleiro Vulkan, em
Dantzig.
4) Estaleiro Neptun, em
Rostock.
Existiam estaleiros menores,
adaptados depois do início da guerra, cuja produção era menor, em:
1) Emden
2) Wilhelmshaven
3) Flensburgo
4) Kiel
5) Lubeck
6) Stettin
No interior da Alemanha havia
indústrias menores que fabricavam peças avulsas e instrumental para
submarinos. Estas fábricas enviavam sua produção aos estaleiros da
costa e achavam-se situadas nos seguintes lugares:
1) Essen
2) Dusseldorf
3) Mahnheim
4) Karlsruhe
As fábricas de motores
marítimos e de acumuladores especiais constituíam outra
contribuição importante. As principais fábricas de motores
marítimos, na época, eram:
1) Man em Augsburgo, que
fabricava a metade dos motores Diesel utilizados nos submarinos.
2) Humboldt-Deutz und Diesel,
em Colônia, seguindo-se em ordem de importância à anterior.
3) Burmeister-Wain, em
Compenhague, incorporada a força, quando a Dinamarca foi ocupada.
Quanto às fábricas de
acumuladores, destacavam-se:
1) Acfa, em Hannover.
2) Hagen, no Ruhr.
3) Uma fábrica instalada em
Viena, Áustria.
4) Uma fábrica instalada em
Posen, Polônia.
Estas duas últimas fábricas
foram instaladas durante a guerra, e logo após a ocupação destes
territórios.
A versão de King
Transcrevemos declarações do
Almirante Ernest King, chefe das Operações Navais dos Estados
Unidos, numa entrevista à imprensa: "Nunca se viu tantos homens
cruzando os mares como durante a atual guerra. Os oceanos e os mares,
as águas cercadas de gelo do Ártico e as vastas extensões
pontilhadas de ilhas do Pacífico Sul tiveram que ser consideradas
como zonas de guerra. Ao deflagar a guerra no Pacífico, as armadas
aliadas se propuseram proteger, para o transporte marítimo, todos os
mares. Estabeleceram-se três objetivos: vencer a ameaça submarina
alemã no Atlântico; manter os japoneses ao norte das rotas
marítimas da Austrália e Nova Zelândia; reabertura das rotas do
Mediterrâneo.
Era impossível, ainda,
vislumbrar quando se alcançariam esses objetivos.
Os submarinos afundavam barcos
diariamente nas águas norte e sul-americanas. As perdas, devido a
esses ataques, eram devastadoras num setor do Atlântico onde não se
conseguia dar aos barcos a devida proteção aérea provinda de bases
terrestres. A luta foi, a princípio, encarniçada. Somente a marinha
dos Estados Unidos perdeu mais de quinze mil homens e a cifra dos
feridos chegou a vinte e cinco mil. Em meados de 1943, as forças
navais haviam perdido um encouraçado, cinco porta-aviões, nove
cruzadores, quarenta e dois destróieres, dezessete submarinos e
sessenta e seis barcos de outros tipos; um total de 140 navios de
guerra. Não foram menores as perdas das forças navais das outras
nações aliadas no Atlântico e no Mediterrâneo. As perdas foram
sérias, mas desde que pusemos em ação o plano conjunto para vencer
a ameaça submarina, em meados de 1943, calculamos que, em seis
meses, foram afundados 150 submarinos alemães, capturando-se grande
parte de suas tripulações. A solução que encontramos para o
ataque aos submarinos foi o emprego combinado de aviões, navios de
guerra e porta-aviões, especialmente um tipo de porta-aviões de
tamanho reduzido, de rápida construção.
Com a cooperação para o bem
da causa comum de outras repúblicas americanas, estabeleceram-se
bases aéreas nas costas norte e sul-americanas, nas ilhas da
Inglaterra, e em todos os lugares de onde se pudessem enviar aviões
para patrulhar as rotas marítimas do Atlântico. Voando baixo, quase
raspando as ondas, os pilotos localizavam os submarinos ou seus
rastros e, muitas vezes, conseguiam afundá-los, lançando bombas do
ar, ou transmitiam pelo rádio suas posições aos navios de guerra
que mais tarde os perseguiam. O pessoal militar e as forças navais
dos países americanos prestaram valiosa contribuição à campanha.
Em qualquer parte em que os aviões, partindo de bases terrestres,
pudessem patrulhar o mar em número suficiente, diminuíam os
afundamentos. Os alemães tiveram, por fim, que cessar suas operações
submarinas em grande escala nas águas americanas.
O objetivo da campanha
submarina de Hitler era evitar que a substancial ajuda dos Estados
Unidos em homens e abastecimentos cruzasse o Atlântico.
A prova evidente que esta
campanha foi irremediavelmente frustrada, se traduz nos comboios
repletos de munições e abastecimentos que chegam intactos à
Inglaterra e à Rússia, e no grande número de tropas americanas bem
treinadas e equipadas, acantonadas no outro lado do Atlântico.
Embora a ameaça submarina, de certo modo, perdure enquanto durar a
guerra, não será exagerado dizer que a batalha do Atlântico está
quase terminada."
A segunda oportunidade
Graham era veterano na luta
anti-submarina, ou pelo menos esse era um dos grandes problemas da
sua vida há quatro anos. Ao se iniciar a guerra, fôra nomeado
comandante da fragata Anubis, uma nave recém-saída dos estaleiros
britânicos. Sua vida como comandante teve a duração da vida da
fragata; escoltava um comboio no Mar do Norte quando um submarino
alemão a afundou.
Graham levou alguns meses
recuperando-se em um hospital e esperando novo destino. O Almirantado
tornou a confiar-lhe uma fragata, que Graham batizou novamente de
Anubis.
Em meados de 1944 navegava
novamente pelo Mar do Norte escoltando um comboio. Havia um certo
clima familiar para o comandante, o que constituía, ao mesmo tempo,
um motivo de temor e de desafio.
O radar entrou em contato com
o submarino lá pelas quatro da tarde. Tentaram precaver-se contra o
ataque, porém, uma hora mais tarde, dois cargueiros leves voaram
pelos ares quase ao mesmo tempo. Graham perdeu então, a noção que
leva os homens comuns a distinguir o dia da noite, e o descanso do
trabalho; para ele, o tempo era igual e sem importância, pois
somente abrigava uma idéia: apanhar o submarino.
Subia e descia várias vezes;
o operador do radar chegou a considerá-lo um membro qualquer da
tripulação. Em nenhum lugar do navio demorou-se mais de vinte
minutos. O submarino se afastava lentamente e, por volta das oito da
noite, perderam contato com ele.
Graham ficou desesperado,
porém, precisava conter-se, para encontrar o submarino: paciência,
intuição e concentração; por enquanto só paciência. Na
madrugada do dia seguinte, Graham estava esgotado; foi recostar-se,
mas virava e revirava em seu beliche. Finalmente, acordou o médico e
lhe pediu um sonífero.
-Isto o fará dormir por
algumas horas - disse-lhe o doutor Wilson dando-lhe um comprimido
branco. - O senhor está muito esgotado. Graham pegou o comprimido e
o copo de água que lhe estendia o médico, e ia beber quando falaram
pelo alto-falante: - Capitão, entramos novamente em contato com o
submarino!...
Graham cuspiu violentamente a
pílula e devolveu o copo para o doutor. - Daqui a pouco vou poder
dormir! - gritou, saindo às carreiras do camarote.
O Anubis começou uma caça
implacável. Em poucos minutos semeou seu trajeto com bombas de
profundidade. Porém o submarino não dava sinal de vida. Por um
momento, pensaram que escapara novamente. Graham praguejou durante as
quatro horas seguintes até que, com sol a pino, o "U"
surgiu na superfície.
- Aos canhões! - bradou o
capitão.
A tripulação do submarino
tentou defendê-lo, mas uma descarga bem na linha de flutuação
demonstrou que o "U" estava perdido. Começaram a atirar-se
às águas.
Sujos de petróleo e
esmorecidos de frio foram recolhidos, um por um, pelos homens do
Anubis.
Era a primeira vez que Graham
via marinheiros alemães de perto. Dirigindo-se ao seu imediato,
comentou com um quê de nostalgia: "Fazem-me lembrar os
tripulantes de minha primeira fragata quando fomos recolhidos por um
cruzador americano...
O tubarão e os peixes
pequenos
Em certos lugares do
Atlântico, apesar da proteção das escoltas, as travessias eram
sumamente perigosas; as perdas causadas pelos submarinos continuavam
sendo vultosas. A solução do problema foi devida, em parte, a uma
mudança de orientação na construção de porta-aviões. Ao começar
a guerra, os únicos porta-aviões aliados eram gigantes do mar, com
cobertas de vôo medindo mais de 200 metros de comprimento. Mas o
número disponível para patrulhar grandes extensões do Atlântico
era limitado, visto que eram necessitados com urgência no Pacífico,
e se requeria anos para construir-se uma frota desses gigantes.
Começou-se, então, a estudar
a possibilidade de construir-se porta-aviões menores e rápidos, com
tripulações de aviões navais aperfeiçoados e que pudessem decolar
em pistas reduzidas. Um dos recursos foi fabrica-los tendo por base
os cascos de navios mercantes comuns. Por outro lado,
aperfeiçoaram-se notavelmente os processos de construção. Nos
Estados Unidos começaram a ser construídos em grandes quantidades.
Os porta-aviões pequenos cumpriram então, o papel de
navios-escoltas, atacando os submarinos que se encontravam fora do
alcance dos aviões com bases na costa. Uns cinqüenta, integralmente
fabricados nos estaleiros americanos, ganharam alto-mar em comboios,
e seus aeroplanos, com a ajuda dos destróieres, diminuíram em muito
as perdas no Atlântico.
Um desses navios, que protegia
um comboio no Atlântico, atacou com seus aviões durante a travessia
seis submarinos. Dois foram a pique e outros quatro fugiram
avariados.
O primeiro ataque ocorreu ao
amanhecer. Um piloto lançou bombas de profundidade contra um
submarino que avistara na superfície, mas não pôde constatar se o
afundara ou avariara.
Nos dias seguintes, dez
ataques se efetuaram. No primeiro dia, pela manhã, um aviador
atingiu em cheio um submarino, que permaneceu à deriva durante uma
hora, até que foi ao fundo; mas não havendo por perto navios de
guerra que atestassem o afundamento, não pôde ser considerado
oficialmente destruído.
Dois mais foram a pique antes
do meio-dia, e, à tarde, outro mergulhou, seriamente atingido pelas
cargas de profundidade.
A tripulação jogou-se ao mar
e foi recolhida por um navio de guerra aliado. No dia seguinte, outro
explodiu, salvando-se o capitão e dezessete tripulantes. Nesses
combates, o porta-aviões perdeu cinco aviões, porém o comboio
chegou intacto ao seu destino.
Cirurgia no mundo
silencioso
"Agora estão dando éter
a ele" sussurrava-se no compartimento dos torpedos da popa. "Já
está começando a dormir! Está prontinho para ser aberto!"
A cara de um marinheiro
apareceu: - Procure manter-se na horizontal, Jake - disse ao
encarregado do leme de imersão de proa -. Já está cortado. Estão
fuçando agora!
Os que "fuçavam"
estavam reunidos em torno de uma mesa, com os braços enfiados em
pijamas, vestidos de trás para diante. Dos seus rostos cobertos, a
única coisa que se vislumbrava era a expressão ansiosa dos olhos. E
o que procuravam era, nada mais, nada menos, que um apêndice, em má
hora inflamado, de Dean Rector, o hidrofonista de bordo. Completara
dezenove anos na véspera; e como presente de aniversário, aparecera
aquela dor aguda e insuportável.
Num instrumento parecido com
um grande relógio estava marcada a profundidade em que o submarino
se encontrava. Sobre suas cabeças, nas águas inimigas, passavam e
repassavam, com as hélices barulhentas largando uma esteira de
espuma, os caça-submarinos japoneses.
Não se podia sequer pensar
num médico da marinha num raio de milhas e milhas ao redor. Que
fazer? Para evitar que o apêndice supurasse não havia outro remédio
senão operar Rector. E isso tinha que ser feito por eles mesmos,
seus próprios companheiros de trabalhos e perigos, os próprios
tripulantes do submarino.
O "operador-chefe"
foi Wheeler Lipea, sargento de vinte e três anos, do Corpo de Saúde,
que passara três anos no Hospital da Marinha de Filadélfia, onde
tomava conta de um cardiógrafo. Uma ou duas vezes, por mera
curiosidade, viu os cirurgiões do hospital na faina de extrair um
apêndice. A anestesia era mais complicada. Sob a superfície, a
pressão existente no interior do submarino é superior à
atmosférica. Daí a necessidade de absorver maior quantidade de
éter.
Os cirurgiões improvisados
não sabiam quanto tempo ia durar a operação, nem se haveria éter
suficiente para manter a anestesia até o final. Escolheram a mesa da
sala dos oficiais, sala que nos submarinos tem as dimensões de uma
saleta de carro-dormitório. De um lado e de outro, existiam bancos
presos à parede.
A mesa ocupa todo o
compartimento. É preciso entrar já com as pernas dobradas como se
fosse sentar. A mesa tinha o comprimento estritamente necessário
para que o operado não ficasse com os pés balançando.
Não creio que jamais se haja
realizado uma operação cirúrgica mais democrática que aquela.
Todo mundo, desde o oficial de curso até o cozinheiro, desempenhou
nela um papel consciencioso.
O cozinheiro adaptou a máscara
para a anestesia; um coador de chá invertido, coberto de gase. O
cirurgião teve por ajudantes, oficiais superiores em idade e
hierarquia. O anestesista foi o Tenente Franz Hoskins, oficial de
transmissões.
Antes de levar Rector à sala
de operações, o comandante do submarino, Tenente-de-Fragata
Ferrall, de Pittsburgh, pediu a Lipes que falasse com ele:
- Olha, Dean - disse Lipes -.
Eu nunca fiz uma operação antes... Mas tenho que te prevenir que se
não te operamos, você será um homem ao mar, de qualquer maneira...
O que é que você diz?
- Compreendido, doutor -
respondeu o moço - Pode abrir...
Era a primeira vez na sua vida
que Lipes ouvia alguém chamá-lo de "doutor".
O operador e seus ajudantes
colocaram suas máscaras de gase. Os mecânicos amarraram bem os seus
pijamas, ao contrário. O instrumental estava muito longe de ser o
mais apropriado para uma verdadeira operação cirúrgica. O bisturi,
por exemplo, não tinha cabo. Porém, os marinheiros de submarinos
são, em geral, gente habilidosa e improvisadora. Na farmácia
portátil havia alguns hemostatos, essas pinças que se usam para
obturar vasos sanguíneos - e o primeiro maquinista transformou um
deles num cabo para o bisturi.
Moeram algumas pastilhas de
sulfanilamida para usá-las como anti-séptico. Porém, como manter
separados os bordos do corte depois de praticar a incisão? Como
arranjar os afastadores que os cirurgiões utilizavam para esse fim?
Virou-se e revirou-se a farmácia. Nada havia ali que, mesmo
remotamente, pudesse resolver o caso. Apelou-se então para o arsenal
da cozinha. De quem foi a idéia luminosa? Nunca se soube, mas o fato
é que alguém apareceu com umas colheres dobradas em ângulo reto
que serviram como afastadores.
E para esterilizar? Os
torpedos então funcionaram como algo mais que mensageiros da morte e
do extermínio. Extraiu-se álcool do mecanismo de explosão de um
deles. Colocaram também a ferver uma boa panela de água. Chegou
então o momento da operação. Rector, intensamente pálido,
deitou-se na mesa. Mergulharam umas luvas de borracha no álcool do
torpedo. Depois colocaram-nas no cirurgião. Eram um pouco grandes.
As pontas dos dedos ficaram frouxas. Um dos circunstantes não pôde
agüentar uma comparação: - Estás parecendo o Mickey Mouse. -
Lipes esboçou uma careta à guisa de resposta, por trás da máscara.
Olhou seus ajudantes. Fez um sinal com a cabeça. Hoskins cobriu a
cara de Rector com a máscara de anestesia.
O cirurgião, valendo-se do
antigo processo manual de medida, apoiou o dedo mínimo no umbigo de
Rector e o polegar na ponta do ilíaco ântero-superior. Onde o dedo
indicador bateu, era ali o ponto - que os médicos chamam de McBurney
- em que devia ser feita a incisão.
Ao lado de Lipes estava o seu
primeiro ajudante, o Tenente Norwell Ward, cuja missão consistia em
colocar as colheres como afastadores, à medida que Lipes fosse
penetrando nas camadas musculares. Ao Tenente Charles Maning coube o
papel que, nas salas de operações recebe a denominação de
"enfermeira de salão". Era responsável pelos pedaços de
algodão e gases esterilizados e devia providenciar, quando
necessário, o álcool dos torpedos e a água fervida. O Comandante
Ferral se encarregava da "contabilidade". Teria que contar
cuidadosamente os chumaços de gase e as colheres que iam sendo
colocadas no paciente.
Vinte minutos mortais demorou
Lipes para encontrar o apêndice.
- Já explorei todo um lado do
ceco - murmurou - Vou explorar o outro, agora.
A guisa de boletim médico, um
rosário de murmúrios transmitia os detalhes da operação ao
compartimento dos motores e aos alojamentos da tripulação. - O
doutor já explorou um lado de não sei que, e vai agora começar do
outro.
Depois de novas pesquisas,
Lipes murmurou: - Acho que achei agora... Está escondido atrás do
ceco.
A partir desse instante, a
vida do seu companheiro estava em suas mãos. - Mais um par de
esponjas!
"Dois chumaços de gase
às 14h 45m", anotou escrupulosamente o comandante no seu
caderninho.
- Mais lanternas... Outra
lâmpada! - ordenou Lipes. O rosto do operado começou a contrair-se.
- Mais éter! - comandou o
"doutor". Hoskins parecia contrariado. O éter estava
acabando. Teve que empapar de novo a máscara. O pessoal que fazia a
operação começava a se sentir enojado pelas emanações do
anestésico. Afinal, o cirurgião fez um sinal para que lhe dessem a
agulha já preparada com "catgut", previamente tratado com
ácido crômico para facilitar a reabsorção em vinte dias. Um após
outro, foi extraindo os pedaços de gase. Uma a uma, foram
reaparecendo as colheres dobradas. O comandante tocou Lipes no ombro
e mostrou o caderninho: faltava uma colher. Lipes introduziu de novo
a mão no corte, retirou a colher e fechou definitivamente a ferida.
Cortou o fio com uma tesourinha de unhas. Naquele preciso instante,
caía sobre a máscara do anestesiado a última gota de éter.
Transportaram Rector para um beliche. Ao fim de meia hora, ele abriu
os olhos e exclamou: - Ainda estou lá embaixo...
Duas horas e meia levaram os
improvisados médicos para realizar uma operação que é realizada
em quarenta e cinco minutos.
-Bem... Não se tratava de um
desses apêndices de "cheguei, vi e cortei" - diria depois
Lipes, como que se desculpando pela insólita demora. Treze dias
depois estava Rector, de novo, às voltas com seus hidrofones. E, num
dos recantos do submarino, numa garrafinha, num vaivém constante,
começava a se enrugar e a perder a cor, apesar da sua histórica e
singular glória, o primeiro apêndice extirpado pelas mãos do
homem, no fundo de águas infestadas de inimigos.
Esta nota. escrita por George
Weller do "The Chicago Dally News", recebeu, em 1943, o
prêmio de melhor reportagem do ano.
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